Tripla hélice não explica mais os ecossistemas de inovação

A base dos ecossistemas de inovação tem sido, historicamente, a tripla hélice composta pela academia, as empresas e o governo. A academia é até mais recente nesse quadro. Nas primeira e segunda revoluções industriais o papel da universidade praticamente não aparece. Basta lembrar que na história da máquina a vapor e das ferrovias a academia não aparece,  e nem na descoberta da eletricidade ou da linha de montagem de Henry Ford. O papel da universidade de Stanford, entretanto, foi fundamental para o surgimento do Vale do Silício, base da terceira revolução industrial.

No momento em que vivemos a 4ª revolução industrial, há necessidade de rever o modelo de tripla hélice para representar os ecossistemas atuais de inovação. Duas novas hélices precisam ser incluídas, e estão propostas em artigos, ao mesmo tempo que o papel das três originais se modificam e se ampliam.

Podemos chamar as duas novas hélices de empreendedorismo e capital de risco, embora ambas tenham sido gestadas também no modelo de sucesso do Vale do Silício. Quem não reconhece essas duas hélices na história icônica de Steve Jobs retratada em filmes e livros? Alguns autores já colocam até outras hélices no modelo, como sociedade e meio ambiente. Vamos ficar com as duas propostas, por enquanto.

A hélice do empreendedorismo se materializa nas startups e nos ambientes de inovação que as abrigam. Surgem modelos de gestão diferenciados, como o lean startup com conceitos de buscar as dores do mercado, escalabilidade, velocidade, experimentação e pivotagem. E se desenvolvem os ambientes que as abrigam: incubadoras, aceleradoras, hubs e parques tecnológicos.

A nova hélice do capital de risco surgiu forte nos Estados Unidos, com o histórico popular de investimento em ações e na tradição dos juros baixos que provocam a procura por investimentos mais rentáveis.

O papel da hélice governo se amplia com, pelo menos, três aspectos: regulador, financiador e comprador. O regulador ao proporcionar um bom ambiente de negócios favorável ao empreendedorismo; o financiador ao prover recursos principalmente para pesquisa e desenvolvimento e o comprador ao provocar demandas tecnológicas e adquirir produtos do ecossistema. É notório o papel do governo nos Estados Unidos, principalmente no sistema de defesa e na corrida espacial como financiador e comprador de tecnologia.

O papel da hélice academia se modifica ao incentivar o empreendedorismo dos alunos, formar seus próprios ambientes de inovação e se aproximar das empresas em projetos conjuntos.

A hélice das empresas se modificou recentemente com a inovação aberta, chamando o empreendedorismo para ajudar a resolver suas dores e colando na academia em projetos conjuntos, contribuindo para reduzir as diferenças de visão, onde as universidades focavam apenas na formação de gente e na ampliação do conhecimento, muitas vezes até rejeitando ideologicamente a aproximação. Também a cooperação entre empresas, se superpondo muitas vezes à competição, é aparentemente uma tendência, que se materializa nas associações empresariais.

Particularmente aqui no Espírito Santo as cinco hélices estão em movimento acelerado. O governo estadual com o Funcitec e o Funses1, e a ampliação de recursos Finep pelo Bandes. A academia com forte movimento de formação de empreendedores e ambientes próprios de inovação na Ufes, Ifes, Fucape, Faesa, UCL e UVV. A área empresarial com a inovação aberta, a organização de hubs como o FindesLab, Base27, o novíssimo do Senac e vários hubs pelo interior, labs como na Água Branca e Arcelor, centros tecnológicos de ponta como na Vale e  Arcelor e associações empresariais inovadoras como a Action. E também eventos em amplo crescimento como a MecShow e a recente espetacular ESX, promovida pelo Sebrae.

A hélice do empreendedorismo está em alta com pelo menos 300 startups de todos os setores, algumas conseguindo dimensão nacional, abrigadas nas incubadoras, aceleradoras e coworkings que se multiplicam. Até um Parque Tecnológico surge, finalmente, na figura da Cidade da Inovação, coordenada pelo Ifes, nos antigos galpões do IBC.

A hélice do capital de risco se acelera com investidores anjo locais, empresas investidoras e fundos nacionais que circulam cada vez mais pelo estado, atraídos pelo movimento.

E todos juntos e misturados na MCI – Mobilização Capixaba pela Inovação. Se antigamente a imagem do ecossistema era a kombi da inovação, pela pouca quantidade de participantes, agora temos um enorme ônibus-drone com as cinco hélices em movimento.

Fica faltando uma marca que simbolize tudo isso e coloque definitivamente o ecossistema de inovação do estado emparelhado com outros estados, e reconhecido em todo o país.

 

https://es360.com.br/coluna-inovacao/post/tripla-helice-nao-explica-mais-os-ecossistemas-de-inovacao/

 

Publicado no Portal ES360 em 11/06/2023