A observação dos projetos de startups que surgem mostra que a maior parte deles procura resolver alguma dor observada no mercado, porém com uma estrutura sem grandes complexidades, em software, embora com alguma ideia inovadora. Raras ainda são as startups que saem da bancada de pesquisadores acadêmicos, baseadas em tecnologias complexas, por vários motivos, entre eles a falta de familiaridade desses pesquisadores com o empreendedorismo ou o cumprimento de critérios de avaliação que privilegiam a publicação de artigos em detrimento de depósito de patentes ou a iniciativa de empreender uma startup.
Por outro lado, os negócios de base científica nunca estiveram tão em evidência como no período recente da pandemia, como no caso das vacinas, e contribuiram para difundir a importância das startups denominadas de deeptechs.
Deeptechs são startups baseadas em descobertas científicas tangíveis ou inovações de engenharia. Elas tentam resolver grandes problemas que realmente afetam o mundo ao seu redor. São startups que atuam com inovação complexa lidando com problemas como tratamento de doenças, mobilidade, aquecimento global e desenvolvimento na indústria ou no agronegócio.
As deeptechs surgem em diferentes áreas como biotecnologia, engenharia, genética, matemática, ciência da computação, robótica, química, física e tecnologias mais sofisticadas e profundas com algum tipo de inovação significativa.
Segundo o Boston Consulting Group (BCG), o ecossistema de deeptechs pode atrair de US$ 140 bi a US$ 200 bi em investimentos até 2025.
Por isso, essas startups, em geral, são criadas em laboratórios ou universidades, ou em grandes empresas capazes de investir muito, por grupos de cientistas e pesquisadores comprometidos em aplicar seu conhecimento para expandir as possibilidades já existentes no mercado.
Elas são marcadas pelos seguintes aspectos: demandam tempo para desenvolvimento, exigem muito capital, especialmente no início para equipamentos, material, pesquisa, prototipagem, validações etc. e focam em resolver um problema real que possa mudar a vida das pessoas ou aumentar significativamente a produtividade das empresas.
As necessidades de financiamento variam muito com a tecnologia. Por exemplo, dados de mercado mostram que desenvolver o primeiro protótipo em biotecnologia custa em média quase US$ 1,3 milhão, mas em blockchain, custa apenas cerca de US$ 200.000.
Como consequência, as deeptechs raramente seguem a progressão de financiamento estabelecida de outros tipos de startups – buscando dinheiro de amigos e familiares, depois investidores anjo, depois rodadas sucessivas de investimento de capital de risco em avaliações crescentes , levando, em última análise, a uma venda ou um IPO. Nas deeptechs, o financiamento público desempenha um papel importante na fase inicial, e o dinheiro de amigos e familiares raramente é significativo em relação aos requisitos de capital substanciais da pesquisa e desenvolvimento inicial.
Algumas sugestões:
1) As avaliações de pesquisadores deveriam valorizar a organização de startups ou pelo menos o depósito e a comercialização de patentes;
2)As agências de fomento governamentais, com editais específicos, deveriam incentivar mais as deeptechs, pelo impacto relevante no crescimento da economia e na geração de empregos de alto nível tecnológico;
3)Fundos de Venture Capital focados em deeptechs deveriam ser incentivados;
4) O ensino na temática STEAM(Ciência, Tecnologia, Engenharia, Artes e Matemática) deveria ser valorizado para despertar o interesse dos estudantes, desde cedo, pela pesquisa científica e pelas tecnologias complexas.
Publicado em A Gazeta em 24/09/2022