O fundador da Wine, maior e-commerce de vinhos do Brasil, Rogério Salume, gosta de dizer que as empresas precisam transformar clientes e colaboradores em torcedores. Clientes mudam de fornecedor, colaboradores mudam de emprego, mas torcedores de futebol não mudam de time. Jorge Paulo Lemann, o bilionário rei da cerveja e do ketchup, disse recentemente que até um passado recente a palavra-chave era meritocracia, mas engajamento virou o novo mantra corporativo. “É preciso engajar as pessoas dando a elas um senso de participação”. É bem diferente do que consta no livro Sonho Grande da jornalista Cristiane Correa, onde se aprende que quem dissesse em uma entrevista, nas empresas do seu grupo, que gostaria de equilibrar a vida pessoal com trabalho estaria fora automaticamente.
Existem muitas dicas para engajar colaboradores, ou transformá-los em torcedores da marca. Uma delas é criar um alinhamento estratégico dentro da empresa, nas palavras de Peter Drucker, onde todos entendem o seu propósito, sua missão, sua visão e praticam os seus valores. Uma liderança inspiradora é importante, porém os colaboradores costumam seguir as pernas e não a boca dos dirigentes. Se fazem discurso para um lado e praticam outro, é esse outro lado que os colaboradores vão entender como verdadeiro.
Jeff Bezos, criador da Amazon, diz que trabalhar por uma maior comunicação entre as várias áreas da empresa é um sinal de disfunção. Significa que as pessoas não estão trabalhando de forma unida e orgânica. Deveríamos encontrar uma fórmula de fazer as equipes se comunicarem menos e não mais, diz Bezos. Tudo bem se as funções estiverem muito bem definidas.
A minha experiência como executivo de empresa com muitos colaboradores mostrou que uma boa maneira de engajar colaboradores com esse alinhamento estratégico é aproveitar os programas de treinamento e montar turmas misturando equipes de áreas diferentes que passam a se conhecer mais e a criar um relacionamento informal que reduz a incidência de feudos e conflitos internos. Outra maneira interessante de engajamento é uma comunicação aberta onde todos sabem tudo o que está acontecendo, desde números que podem gerar lucros distribuíveis a ações em andamento. Se um colaborador de uma empresa é perguntado em um ambiente informal sobre detalhes de um novo produto e não sabe do que se trata, é sinal de falta de alinhamento. Na situação contrária, ele faz o seu sucesso de botequim, dando uma aula sobre o novo produto da sua empresa. Essa difusão interna de informações é uma boa estratégia.
O engajamento de clientes necessita de ótimos produtos, inovação constante e um conhecimento profundo desses clientes, muitas vezes adivinhando o que ele quer e não sabe ainda. Steve Jobs era mestre nessa arte e não é surpresa que a Apple seja uma das empresas que mais tem torcedores, capazes de dormir na fila na véspera do lançamento de novos produtos.
Na busca por esse engajamento de clientes, as redes sociais têm seu papel na criação de comunidades que participam de debates sobre os produtos e são informados de tudo o que acontece com as marcas, além de palpitar à vontade. O marketing de conteúdo é outra maneira, ao alimentar esses torcedores com informações abrangentes do seu interesse, não associadas diretamente aos produtos.
Nessa época de “quiet quitting”, ou desistência silenciosa, onde os colaboradores querem simplesmente cumprir o que está descrito no trabalho e estabelecer limites para saúde, políticas de bem estar e busca da felicidade se contrapõem à epidemia de burnouts.
A procura pelo engajamento passa a ser crucial. Esse é o senso de participação que Lemann aprendeu a valorizar.
Publicado em A Gazeta em 17/09/2022