Enquanto estamos preocupados em como a inteligência artificial influenciará as nossas vidas no futuro, alguns espertalhões digitais, sorrateiramente, já manipularam algoritmos em várias partes do mundo controlando resultados de eleições, enquanto o povo pensava que estava decidindo o resultado espontaneamente. O problema, porém não são as urnas eletrônicas, o problema são os algoritmos. O populismo tradicional se casa com o algoritmo e cria uma temível máquina política, sendo usada em vários países. E não só durante as eleições.
O excelente livro “Os engenheiros do caos” de Giuliano Da Empoli explica bem essa nova realidade, bastante ativa em muitos países.
A indignação, o medo, a raiva, o preconceito, o insulto, ameaças, falsas acusações, teorias conspiratórias, a polêmica racista ou de gênero proporcionam muito mais atenção e engajamento que os debates enfadonhos da velha política. Um dos líderes da campanha em favor do Brexit diz: “Quando publicávamos alguma coisa sobre economia, recebíamos três ou quatro mil curtidas. Quando incluíamos um fator emocional, tínhamos até dois ou três milhões de curtidas”. Liberar as emoções mais secretas e violentas do público dá mais resultado.
Na campanha do Brexit, dados do Google foram cruzados com dados das redes sociais e com outros bancos de dados para identificar os potenciais apoiadores do Leave(o voto pela saída). Depois com o Lookalike do Facebook identificaram os que se pareciam com o perfil e poderiam ser convertidos. Durante a campanha, foram enviadas mais de um bilhão de mensagens digitais personalizadas. Cada categoria de eleitores recebeu uma mensagem diferente, sob medida. Defensores de animais receberam mensagens sobre novas legislações europeias que ameaçavam os direitos dos animais; os caçadores, mensagens, ao contrário, sobre legislações que protegem os animais; para os liberais, mensagens provocativas sobre a burocracia na Europa. Na campanha de Trump em 2016, foram testadas 5,9 milhões de mensagens diferentes, verdadeiras ou falsas, contra 66 mil de Hillary. A expressão “verdades alternativas” foi incorporada para mascarar mentiras deslavadas.
Antigamente, líderes políticos só dispunham de instrumentos limitados para segmentar seus eleitores. Para uma grande votação tinham que se dirigir ao eleitor médio com mensagens moderadas. Agora, ao contrário, trata-se de inflamar as paixões do maior número possível de grupelhos. A internet abriu um mundo de oportunidades para os propagadores do ódio.
Steve Bannon, que participou do lançamento da Cambridge Analytics, empresa que atuou na campanha de Trump, foi um dos primeiros entre os novos populistas a entender que “a política deriva da cultura”. Desde o começo ele luta para arrancar da intelligentsia liberal a hegemonia cultural. Em vários países essa é a luta de globalistas e terraplanistas e Bannon circula em todos pessoalmente ou com discípulos.
A democracia liberal é uma construção newtoniana, baseada na separação de poderes e na ideia de se poder tomar decisões racionais em cima de uma realidade mais ou menos objetiva. Com a nova política quântica, a realidade objetiva não existe, a versão do mundo que cada um de nós vê é literalmente invisível aos olhos dos outros. Cada um, além das suas próprias opiniões, tem seus próprios fatos.
Para líderes populistas, as verdades alternativas não são um simples instrumento de propaganda. Qualquer um pode crer na verdade, enquanto acreditar no absurdo é uma real demonstração de lealdade. Vai daí o constante descarte de antigos aliados.
Como conclui Da Empoli: “Os algoritmos desenvolvidos pelos engenheiros do caos dão a cada indivíduo a impressão de estar no coração de um levante histórico, e de, enfim, ser ator de uma história que ele achava que estaria condenado a suportar passivamente como figurante”. Parece familiar?
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