O livro “A quarta revolução. A corrida global para reinventar o Estado”, já abordado em dois artigos aqui neste espaço, argumenta – e vamos comentar para o caso brasileiro – que existem três setores em que o Estado precisa aliviar sua carga urgentemente. Primeiro, não mais vender bens ou serviços que não são da sua competência, velha causa da direita. No Brasil, a execução de serviços diretamente pelo Estado tem se mostrado cada vez mais ineficaz. Os controles sobre licitações, necessários em tese, estão cada vez mais atrasando processos, levando a compras sem qualidade pela exigência de menor preço e deixando ordenadores de despesas paralisados, receosos de processos futuros. A estabilidade de funcionários, a dificuldade de contratar os melhores e de implementar uma adequada meritocracia e a corrupção endêmica completam o quadro.
Em segundo, cortar subsídios que afluem para os ricos e bem relacionados, velha causa da esquerda. A “bolsa-empresário” no BNDES, onde o Tesouro emprestava à taxa Selic de 14% e o banco repassava à TJLP de 7%, é um exemplo típico dessa prática, assim como os vários tipos de subsídios dados à grandes empresas na esperança de criar campeões nacionais ou simplesmente para apoiá-las. Alguns mecanismos como esse poderiam ser usados, desde que transparentes e permanentemente avaliados.
Em terceiro lugar, reformar os direitos sociais para garantir que sejam direcionados para quem realmente precisa e que sejam sustentáveis no longo prazo – velha causa de todos que se preocupam com a saúde do Estado. As propostas de desindexar as aposentadorias do salário mínimo, colocar idade mínima para o benefício equiparando homens e mulheres e previdência pública e privada e fiscalizar melhor auxílio-doença, pensão por morte e seguro desemprego vão nessa direção. A entrevista de Ricardo Paes de Barros, especialista em políticas sociais, ao jornal Valor Econômico em 19/06/2016, é esclarecedora. Entre os 40% mais pobres, o mais rico ganha R$ 525. O Bolsa Família atinge os 20% mais pobres e deveria ficar aí, mas tem gente que não está nessa faixa e recebe e tem gente entre os 20% mais pobres que não recebe. É bom saber que o valor é de apenas R$ 77 por pessoa, obrigando a colocar filho na escola e controlar vacinação. Fora os desvios que devem ser corrigidos, a grande maioria é de famílias absolutamente sem oportunidade de trabalho, muitas vezes mulheres sozinhas com filhos e muito ou extremamente pobres. Reclamar de um programa que custa 0,5% do PIB, quando o governo gasta 40% do PIB é desumano. Nossos problemas não estão aí.
Evandro Milet
Consultor e palestrante e escreve artigos semanalmente.
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