Um empresário do setor de confecções de Colatina contratou um designer português que desenhou uma coleção de jeans, vendida para uma cadeia de varejo da Espanha, cuja fabricação foi feita no Marrocos. Esse é o novo normal na indústria onde as atividades necessárias para produzir e disponibilizar um produto ou serviço para o consumidor final são realizadas em várias partes do mundo, no que se chama de cadeias globais de valor (CGV), expressão difundida por Michael Porter, um dos maiores gurus da administração.
De acordo com o um estudo do MIT, entre um grupo de 300 grandes empresas, em média 51% da produção de componentes, 46% da estocagem, 43% dos serviços ao cliente, e 39% do desenvolvimento dos produtos se davam fora do país de origem da firma. Em 2009, as exportações mundiais de bens intermediários excederam o valor das exportações de bens finais, alcançando 51% das exportações de mercadorias.
Após 1989, a dissolução da União Soviética, a abertura da China e a liberalização da Índia e do Brasil abriram essas nações mais plenamente para o comércio e o investimento internacionais. Essas economias gigantes ofereceram fontes aparentemente inesgotáveis de trabalhadores a baixos salários, fabricantes capacitados, matérias-primas abundantes e grandes mercados internos. A China tornou-se a “fábrica do mundo”, a Índia o “back office” do mundo, o Brasil a “fazenda do mundo” e a “mina do mundo”.
Um estudo da OCDE porém estima que apenas 3,4% do preço total de um smartphone montado na China foi realmente adicionado na China. Os outros 96,6% vieram de materiais e componentes importados, principalmente da Coreia do Sul, Estados Unidos e Alemanha.
Há evidências consideráveis de que os maiores lucros revertem para as “empresas líderes” na CGV, que controlam a marca e a concepção do produto.
O processo de substituição de importações que pautou as políticas industriais brasileiras, preconizava fazer tudo aqui, naturalmente com custos mais altos e barreiras enormes às importações. A lógica mudou. O grande desafio agora é participar das CGV com competências específicas e buscando sempre produzir partes com maior conteúdo tecnológico e, se possível, comandando a CGV como faz a Embraer que domina o projeto e a montagem dos aviões, mas importa de 60% a 90% das partes.
Para participar desse processo é preciso ter pessoal qualificado, uma logística azeitada, uma carga tributária razoável, um custo de capital competitivo e uma capacidade de inovar com apoio de um forte ambiente acadêmico. Esse é o problema.
Evandro Milet
Consultor e palestrante e escreve artigos semanalmente aos domingos
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