Há muitos anos, na empresa onde trabalhava no Rio de Janeiro, houve um convênio com empresa semelhante da Dinamarca, que propiciou a vinda de um técnico de lá para um ano de trabalho conosco, enquanto um de nossos técnicos ficaria em Copenhagen pelo mesmo período. Lembro bem do nome, Thomas Daalgard, figura educada e inteligente, além de perspicaz observador. Certa vez perguntei a ele, na curiosidade natural de uma época onde a informação não circulava tão facilmente, o que lhe chamava mais a atenção no dia a dia da vida de um estrangeiro no Brasil, seja no convívio pessoal, seja no que percebia pela imprensa. Além de profissões estranhas como ascensorista e ensacador de supermercado, ele percebia que convivíamos muito com a morte, ocorrência muito escassa no seu país, restrita quase que exclusivamente às situações normais das idades avançadas. E olhe que nessa época não tínhamos atingido ainda os índices bárbaros de 64.000 assassinatos por ano. Guerras do tráfico, balas perdidas, feminicídios, assassinatos de LGBTs, emboscadas de jornalistas e ambientalistas, chacinas, microondas, execuções, esquadrões da morte, assassinos de aluguel, milícias, tribunais do tráfico – a morte em vários sinônimos.
E no trânsito são 55.000 por ano. Nas estradas, malucos parecem fazer roleta russa, ultrapassando onde não pode, carretas imensas transitam em velocidades suicidas e motoqueiros abusados nas cidades, entregam qualquer coisa, inclusive a própria vida,
Temos de acrescentar as mortes por tragédias, frutos de incompetências administrativas, negligências de quem deveria prevenir, descaso de órgãos fiscalizadores, corrupção de fiscais, gestores e políticos. Além do descalabro da saúde pública e outras mazelas que alimentam cada vez mais essa nossa convivência com a morte. Países em guerra por anos a fio não têm esses número de mortes.
A convivência com a morte brutaliza as pessoas e o desespero por segurança difunde soluções medievais de execuções sumárias de bandidos e linchamentos, mais populares que penas de morte pela justiça. Tudo fruto do medo por que passa a população diariamente com assaltos à mão armada, sequestros relâmpagos, arrastões, roubos de carga, bandidos desfilando com armas pesadas, territórios dominados e a infiltração crescente nos poderes, onde a corrupção compra juízes e políticos.
Pesquisas recentes mostram que noruegueses e dinamarqueses são os povos mais felizes do mundo. Ali o índice de homicídios é menos de 1 por 100.000 habitantes por ano. A média do Brasil é 26, com capitais do nordeste chegando a 50. Thomas tinha razão.
Sobre o autor: Evandro Milet é consultor e palestrante e escreve artigos semanalmente sobre inovação e negócios.
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