A Arte do Impossível

Em episódio relatado por Fernando Morais no livro “Chatô, o rei do Brasil”, pode-se ver que a tese de que os fins justificam os meios já vem de longe na política. No final de 1954, preparava-se a candidatura de JK à Presidência no ano seguinte e era fundamental o apoio de Assis Chateaubriand, que acabara de perder a eleição para senador pela Paraíba. Para apoiar JK ele exigiu um mandato de senador e tomando posse junto com os outros ganhadores da eleição que acabara de acontecer. Neste caso a política mostrou-se a arte do impossível. A operação aconteceu no Maranhão, onde a política era dominada por um coronel do PSD, partido de JK. Um senador eleito renunciou ao mandato junto com seus dois suplentes, obrigando a realização de uma nova eleição convocada imediatamente. Como não havia na época a necessidade de domicílio eleitoral, Chateaubriand foi candidato, venceu e pouco tempo depois tomou posse junto com os outros. O enviado do PSD para organizar a operação, que provocou indignação na comunidade política local, foi ninguém menos que Tancredo Neves.

A prática de usar os grotões ou de atropelar as políticas regionais em prol de um resultado nacional é usada por todos os partidos nos processos de negociação. Aliás, o bilionário Warren Buffet dizia que aprendera sobre negociações nas mesas de pôquer. Em uma mesa – dizia ele – você tem quinze minutos para descobrir quem é o otário. Se não descobrir nesse tempo é porque o otário deve ser você. Assim como no pôquer, também na política o blefe, a dissimulação e o diversionismo fazem parte do jogo. O folclore político diz que não se deve fazer reunião antes de estar tudo combinado, não se deve enviar carta para a qual não se sabe a resposta e se você avistar um jabuti em cima de uma árvore deixe-o lá porque jabutis não sobem em árvore e portanto alguém o colocou lá, ensinava o velho cacique político maranhense Vitorino Freire. O ex-governador de Minas Magalhães Pinto, aquele que celebrizou a comparação da política com as nuvens – cada vez que você olha está diferente -, certa vez, em clima de grave crise, ao relatar um encontro no aeroporto no dia anterior com Tancredo Neves, adversário político, contava: – “Ele me disse que ia para Brasília para que eu pensasse que ele estaria indo para São Paulo, mas ele ia mesmo era para Brasília”. Outra antiga raposa, o mineiro Zezinho Bonifácio dizia que o problema para um político se reconciliar com antigos desafetos era a própria família, porque você contava em casa tudo que o outro havia lhe feito e nada do que você havia feito ao outro. Por isso o cinismo político diz que chumbo trocado não dói e os leigos não entendem como antigos inimigos podem se aliar com tanta freqüência. Muita gente se afasta da política por não entender o jogo, mas quem diz que não gosta de política vai acabar sendo governado por alguém que gosta.

Sobre o autor:

Evandro Milet é consultor e palestrante e escreve artigos semanalmente sobre inovação e negócios.

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