Perrengues para implantar cultura da inovação

Por Evandro Milet – Portal ES 360 – 21/01/2024

O mercado exige inovação, os consumidores procuram inovação, os profissionais querem trabalhar em empresas inovadoras, todo mundo acha que inovação em empresas exige difundir a cultura da inovação, mas não é todo mundo que consegue. Por que?

Um problema crônico é o envolvimento da alta administração que pode não existir ou ser fake. A prática mostra que os colaboradores(palavra esquisita – não seria melhor chamar de parceiros ou então de empregados, mesmo?) seguem as pernas e não a boca do líder. Se o discurso da inovação não for acompanhado de envolvimento na prática e demonstração de prioridade, a turma vai fazer outra coisa. 

Tem também a história do medo na organização. Muitos anos atrás, o guru da qualidade Edward Deming colocava entre seus 14 princípios o de tirar o medo das organizações. Se uma ideia apresentada for dispensada sem cuidado, o recuo da postura é natural. Como disse Mark Twain: “Um gato que se senta num fogão quente nunca mais se sentará num fogão quente. Mas tampouco se sentará num fogão frio”. A postura ideal seria difundir o lema “é melhor pedir perdão que pedir licença” incentivando a iniciativa e a autonomia. Mas a liderança tem seu stress próprio, que serve de justificativa renovada, afinal o dele é que está na reta. Se todos começarem a dar ideias demais, a empresa pode perder o foco. Ele tem que calibrar o processo sem meter medo, o que aliás era mais comum, hoje dá assédio moral.  Fundamental conseguir separar o urgente, do prioritário e do estratégico. Ambidestria, cuidar do presente e do futuro, horizonte 1, 2 e 3 da inovação.

Outro atraso para a cultura da inovação é o antigo, mas sempre presente, cemitério das boas ideias: isso não funciona aqui/já foi tentado e não deu certo/vai dar muito trabalho/se fosse bom já teriam feito/é uma mudança muito radical/como fica isso na prática?/vai ser difícil de vender/até agora tivemos sucesso assim, não vamos mudar. Se fosse assim, grande parte das startups não existiria, pois arriscam tudo numa ideia vaga, sem legado para carregar nas costas e acabam atropelando os zumbis do cemitério.

Para poder participar da formulação de novas ideias, todo mundo tem que ter informação. Afinal, diz uma lei antiga, a pessoa não faz o que tem que fazer, faz o que sabe. O que a empresa faz, como faz, qual é a missão, qual é o mercado, quem são os concorrentes, quais são os projetos, tudo tem que ser passado. Isso ajuda até a vestir a camisa. Se alguém perguntar o que a pessoa faz na empresa que trabalha, ela pode fazer seu sucesso de botequim dando uma aula. Pertencimento, dir-se-ia hoje. Um dos empresários mais inovadores, Amâncio Ortega, dono da Zara, concorda: “As informações da empresa precisam estar disponíveis para todas as áreas, em qualquer lugar e em todo momento”.

A inovação aberta criou novos perrengues: se a empresa mostrar suas dores, quem não resolveu as dores até agora fica com receio de ter que explicar porquê. Como muitas startups convidadas a resolver essas dores são do setor de TI-Tecnologia da Informação, a área interna de TI fica nervosa e pode boicotar ou achar que pode resolver, mesmo tendo cada vez um backlog maior à sua espera. Na verdade, isso pode acontecer com qualquer área que recebe essa inovação que foi aberta. A liderança tem que pautar o ritmo e promover a cultura da inovação com comprometimento, senão a coisa desanda.

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