Um outro mundo

Um primo médico, trabalhando em um hospital em Portugal, era chamado nas poucas vezes em que aparecia alguém baleado. Como havia trabalhado no Hospital Miguel Couto no Rio, ajudava a polícia a desvendar a motivação do crime, se passional ou latrocínio, pela posição da bala, tal a experiência adquirida.

Convivendo com amigos portugueses, chama a atenção como segurança não faz parte das preocupações das famílias. Adolescentes se locomovem sozinhos em Lisboa, sem que isso preocupe os pais. Eles se chocaram quando Filipão, então técnico da seleção portuguesa, chamou a parte final de uma competição de “mata-mata” e muito mais se chocam ao verem pessoas degoladas, opiniões sanguinárias na internet e 60.000 assassinatos por ano no Brasil.

O jornalista H.L. Mencken tem uma frase que cabe bem aqui: “Para todo problema complexo existe uma solução simples, rápida … e errada”. Quando mais de 100 presos são assassinados em presídios, as opiniões nas redes ou mesmo na roda dos amigos dizem “devia matar mais”, “bandido bom é bandido morto” e por aí vai, como concorda grande parte dos brasileiros em pesquisas. É compreensível a revolta causada pela insegurança, mas temos de pensar racionalmente em como resolver o problema. Jovens que não estudam nem trabalham no Brasil são mais de 9 milhões. Este é o exército de reserva do tráfico. Podem matar muitas levas de 100 que outros vão substituí-los pelo dinheiro e poder do tráfico. A barbárie como solução brutaliza a sociedade e suja a imagem do país. Darcy Ribeiro previu em 1982: “Se não construirmos escolas, em 20 anos não haverá dinheiro para construir os presídios necessários.”

Muitos pedem pena de morte, mas ela já existe, decretada por tribunais do tráfico em ritos sumários, guerras por pontos de drogas ou confrontos com a polícia. Não se vê bandido velho, o sujeito nesse meio morre antes. Pena de morte não meteria medo em ninguém. Grandes traficantes contratam bons advogados, pagam propinas estratégicas e montam escritórios dentro dos presídios para controlar seu exército e transformar pequenos delinquentes – são 90% dos presos – em profissionais.

Aqui no Estado um bom caminho foi encontrado, com resultados na redução de assassinatos e na gestão das prisões. A solução passa por educação, geração de empregos, ocupação social das áreas de risco, ressocialização, penas alternativas, gestão adequada das prisões, inteligência policial, controle de fronteiras, integração de ações, justiça mais rápida e descriminalização de alguns casos. É muita coisa. Vamos demorar muito para ter a tranquilidade de Portugal.

Sobre o autor:

Evandro Milet é consultor e palestrante e escreve artigos semanalmente sobre inovação e negócios.

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